Acabou de Morrer
"Entre Costelas, Confissões e Acusações"
Uma crônica quase policial com pitadas de teologia e torresmo.
Era um sujeito como tantos: um amálgama de virtudes e vícios, um equilibrista existencial entre a bondade e as questões moral. Entre seus predicados mais recentes, podia-se dizer que não guardava rancores, os poucos desafetos que possuía haviam morrido (acidente? castigo divino? coincidência mórbida?). Estava sempre de bem com a vida, cercado de bons amigos. Poeta nas horas vagas, cronista nas outras, jamais usou a pena para trespassar reputações — embora cutucassem muita gente indiretamente.
No entanto, no seu histórico pessoal repousava um passado de arrogância, orgulho, mentiras criativas e julgamentos sumários. Tinha uma língua viperina que, se pudesse, condenaria as masmorras do esquecimento eterno todo aquele que atravessasse seu caminho com más intenções ou más opiniões. Ultimamente, dizia que lutava para melhorar. Ao menos, mentir, já não mentia tanto...
Apesar de não se considerar religioso — longe disso — era um estudioso ferrenho das Escrituras, e confrontava padres, pastores e teólogos como quem joga xadrez com o diabo e ainda o vence no xeque-mate da hermenêutica. Para ele, religiões institucionais eram como empresas falidas em recuperação judicial com prazo vencido. A única igreja que respeitava era a Igreja invisível, o Corpo de Cristo, onde ele se considerava fiel membro, e o seu pastor era Cristo.
Naquele dia fatídico, ligou para a esposa com entusiasmo faminto:
— Amor, prepara aquela costela de porco com polenta, daquele jeito... já tô chegando!
O recado era claro, mal sabia ele que cada dentada na pururuca seria um golpe certeiro nos seus pobres dentes. A mulher, zelosa e dedicada, regou o preparo com vinho e amor. Só que as horas passaram, e o tal marido... não chegou.
Às 14h, após chamadas não atendidas, começou a preocupação. Lá estava ela, entre uma taça e outra, sentindo no ar um cheiro de tragédia e torresmo esfriando.
Enquanto isso, o dito cujo, que até então acreditava firmemente estar vivo, acordava num túnel escuro, gelado, numa espécie de cenário improvisado entre o além e o abismo. Em meio a um turbilhão de pensamentos, como num filme noir, entre o real e o imaginário, como um paciente a despertar de uma anestesia, perdido no labirinto da confusão mental, perguntava-se: "Onde estou? Para onde vou?". A irritação e o desconforto eram como algemas, a saudade da costela de porco, uma tortura.
— sussurrou, procurando o celular no bolso. Nada.
De repente, como num passe de mágica, a ficha caiu e ele se viu na escuridão de um túnel. "Será que é o que estou pensando?", indagava-se. "Preciso ligar para a minha esposa, onde está o celular?". Naquele lugar frio e tenebroso, tentava encontrar-se, quando, ao longe, vislumbrou um fio de luz.
Vozerios surgiam da escuridão. De um lado, vozes suaves, familiares, dizendo "vem para cá". Do outro, gritos incisivos, acusatórios, advertindo "não vá, é cilada!". O homem, já entre o choque e o chilique, tentava decifrar se estava num filme de terror ou numa peça mal escrita de teatro celestial.
Foi então que surgiram dois seres: um anjo, alto, resplandecente, com olhar sereno e voz de quem já leu todos os Salmos, e diz: Um passo em falso e cairás num abismo sem fim. O abismo eterno". Palavras assustadoras que ecoavam como o dobre de um sino fúnebre; e um outro, com aparência um tanto... carimbada: olhar matreiro, tom sarcástico e um leve cheiro de enxofre e hipocrisia.
— Esse aí é meu
— disse o acusador, apontando com sua unha alongada.
— Ainda não, responde o anjo, calmo como quem lê Eclesiastes numa tarde de sábado.
Instaurou-se ali uma espécie de júri improvisado, uma audiência celestial com clima de fórum e fofoca. O anjo apontava as boas obras: orações, arrependimentos sinceros, jejuns com vinho e carne de porco. O outro enumerava defeitos, pecados ocultos, pensamentos impróprios e... cobiças.
— Ele olhava os traseiros das mulheres na rua! Acusa o carcamano.
— Olhava, mas não tocava — respondeu o anjo. — E sempre se arrependia... (depois que a sua esposa ameaçava deixá-lo dormindo no sofá rsrsrsrs, mulher sempre tem uma carta na manga... rsrsrs).
— É verdade, eu ponderava, como diria os mais sensatos dos héteros viventes, antes um peito na... bip bip bip.
— Ei, vai devagar, senão o capeta o leva.
— Opa, desculpe... mas então vamos sair daqui logo, está muito frio e escuro, se é o que estou pensando mesmo, acaba logo com isto e leva-me para o paraíso".
— "Opa, calma lá", interrompeu o acusador... "a nossa disputa ainda não terminou. Temos muito para conversar. Sabes que a tua esposa, os teus parentes e amigos saíram à tua procura, mas não te encontraram, caíste num atoleiro e o teu carro foi coberto por lama e ramos e raízes de árvores, eu planejei tudo com muito cuidado. Jamais te encontrarão e a tua mulher nem seguro receberá...". "
— Tu és um demónio".
—"Claro, muito prazer".
—"O que mais queres, já causaste muitos danos".
—"Calma, eu ainda nem comecei, outros que por aqui passaram, já estão lá comigo e tu serás o próximo".
—"Oh, seu anjo, ou melhor, quem és tu mesmo? És o Gabi, né? Manda esse capeta para o quinto dos infernos".
—"Não é bem assim, meu caro, pela justiça divina ainda temos alguns passos a serem galgados, temos questões a serem resolvidas.
— Ele mentia!
— Eu dizia apenas que estava ocupado, ou que “não dava pra sair hoje”. Mentirinhas sociais...
— Não, não vou, eu pedi perdão pelos meus pecados, em minha mente sempre me esforçava em controlá-la era muito difícil caramba, não era nada fácil, mas eu sempre pedia perdão.
— Deixa-me verificar essas informações se procedem. Hum é vero, você sempre pedia perdão. Mas repetia seus erros.
— Aí tá vendo? Vem logo companheiro, você já é nosso.
— Nãaaaoooo... meu Deus, eu não quero ir para lá... ele está me provocando. Tira essa praga daqui. — Calma vamos resolver isso logo. — Agora para finalizar, você foi idolatra.
— Imagina, eu nunca fui devoto de santo, ou de nossa senhora Aparecida seja lá que santo for.
— Ainda bem, seria bem pior, mas você tinha outros deuses, como, o dinheiro, queria muito o poder e a fama apesar de não os tê-los. Isso te consumia e você não deixava que Deus guiasse seu caminho, pois você buscava pelas forças próprias por essas coisas.
— Mas eu aceitei a Cristo como meu único e suficiente salvador. Eu orava, eu ofertava eu ajudava as pessoas...
— Não perca seu tempo, o anjo já falou tudo que você é e ainda não falou que você bebia bebidas alcoólica.
— Calma aí eu somente bebia vinho e cerveja e de vez em quando uma branquinha para esquentar.
— Beber não é um impeditivo para a sua salvação. Isso foi um método usado pelo inimigo para causar religiosidade e separação, as pessoas se acham mais santas quando não bebem, mas fazem coisas piores. A bíblia condena a embriaguez.
— Está vendo só capiroto...
— Não me provoque, você também, frequentava danceterias, bailes, teatros, ia aos shows de banda de Rock.
— Ia sim, me diga onde está escrito na bíblia que isso seria um impeditivo para a minha salvação? seu tinhoso, carcamano.
Nesse momento o anjo intervém:
- a bíblia não fala nada disso, isso é mais algumas das falácias como instrumento de religiosidade.
— Ah, ah, ah, perdeu capiroto... O anjo intervém,
- Deixa-o quieto, e alto lá que ainda não terminamos, muitas águas ainda vão rolar.
Ufa, já estou cansado, sem comer aquela deliciosa costela que minha nega preparou, e estou aqui neste lugar frio, malcheiroso... Estou perdendo minhas forças. Nesse momento o inimigo joga sua última acusação fatal...
— Eita que agora é que vai ficar bom... Conta ai, aquela vez que você...
No ápice da discussão, com acusações e defesas jogadas como espadas e escudos, o pobre homem, já exausto e faminto, lamentou: Mas antes que a sentença fosse proferida, ouviu-se um espirro retumbante. “Achim! Achim!”.
Era ele, de volta à sua cama, sendo sacudido pela esposa aflita:
— Acorda, homem! Acorda... Tá suando, gritando... o que houve?
— Eu... eu morri! Ou quase. Sonhei com o Anjo, o Diabo, o Apocalipse... e a costela!
— Você só teve um pesadelo, querido. Agora se levanta, lava esse rosto que vou preparar a sua costela.
— Graças a Deus... nem acredito — disse ele, respirando aliviado, enquanto pensava silenciosamente: Preciso rever meus conceitos... e meus pecados. Mas antes, a pururuca.
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Pois bem, esse rapaz estava apenas sonhando — um pesadelo que, por pouco, não se tornou real. E você? Já parou para pensar seriamente sobre sua eternidade?
Se a morte batesse à sua porta hoje, você teria certeza da sua salvação? Ou considera essa questão apenas uma fantasia religiosa? E se, por ventura, estiver equivocado? Já imaginou encarar a eternidade em sofrimento, longe da presença de Deus?
Este é um convite, não uma acusação: talvez seja hora de você refletir sobre sua condição espiritual. Ou você está inserido no Corpo de Cristo — vivendo sob a graça do Salvador — ou está caminhando, ainda que sem perceber, rumo ao tormento eterno.
Vamos supor que você pense que estou enganado, mas mesmo assim não tem plena convicção sobre o que acontecerá após a morte. Se eu estiver errado e você morrer, nada se altera — a existência simplesmente se encerra.
Mas se eu estiver certo, e você morrer sem ter reconhecido Cristo como seu único e suficiente Salvador, não haverá mais tempo para arrependimento. A oportunidade se esgota com o último suspiro e irás para o tormento eterno.
Por isso, pense bem: aceitar a Cristo é a escolha mais prudente. Se Ele for mesmo o Caminho, como cremos, sua vida eterna estará segura. E se, no fim das contas, estivermos errados? Bem, você não terá perdido nada.